segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A mentira

Um dos grandes inconvenientes de Adolfo era mentir muito. As mentiras eram sempre diáfanas e até lhe davam uma auréola especial. Mas para se ser um bom mentiroso tem que se nascer já com essa vocação. É que não é mentiroso quem quer!
Adolfo tinha uma mentira fácil. Mas também se esquecia, com facilidade, das que dizia. Daí ter já sido apanhado várias vezes. Não era um mitómano. Apenas alguém que se servia dessa faceta para se livrar de um problema de ocasião.
Era assim que andava na Universidade há quatro anos e ainda não terminara o primeiro. Em casa todos estavam convencidos que ele era quase advogado. E, quando o Pai, esse sim do ofício, lhe disse que nessas férias conviria assegurar a ausência de um dos estagiários, ele sentiu um calafrio.
De imediato, acossado, respondeu que tal não seria possível, porque havia sido selecionado para frequentar um workshop de direito comunitário. Estranhando tanto empenhamento nos estudos em época estival, começou a fazer-lhe perguntas e não ficou convencido com as respostas...
Pressentindo que o seu golpe podia ser descoberto, disse que até havia uma carta da Faculdade a formalizar o dito convite e que ele a trouxera em mãos. A falsidade estava lançada. Agora havia que lhe dar forma. Para tal era necessário papel timbrado e forjar o texto adequado. Adolfo que era um sedutor lá conseguiu que uma das meninas da secretaria, à sucapa, lhe arranjasse, o material necessário.
Faltava arranjar o pior: um título e um conteúdo para o grupo de trabalho. Também isso ele empenhadamente fez, juntando vários temas que enconrou na net sobre o assunto.
E fê-lo bem, pensou. Só que quando o Pai viu a carta, disse-lhe que iria falar com o orientador do seminário para assistir a um dos temas... Adolfo nem pestanejou. Mas não percebeu se havia cometido alguma falha. O que sabia é que era necessário emendar a mão.
Deste modo, quando a data estava a aproximar-se, disse ao progenitor que, afinal, decidira optar pelo escritório.
"Calculo que sim. Mas não será para mais do que paquete, pois é para isso que dá o primeiro ano da Universidade e os teus diminutos conhecimentos.
A mentira, por norma, tem perna curta. A tua, essa, nem perna tem. Vais ficar no escritório, sim, nessa função. E estudar em horário laboral. À tua custa, claro. Porque o curso que devias ter feito, eu já to paguei. Agora é a tua vez. Da próxima, arranja alguém que saiba fazer um sumário sobre direito comunitário... ou, então, não te aventures naquilo que não dominas".
Consta que, desta vez, a lição lhe serviu. Pelo menos advoga em Lisboa!

Helena

2 comentários:

  1. Pena o pai do PM não ter feito o mesmo ao filho. Assim já não andavamos para aqui com dúvidas sobre a licenciatura mais discutida neste país de crentes

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  2. quantos,não fazem o mesmo.conheço um assim,pena o pai permitir e assim ajudar a destruir a vida do próprio filho...

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