quinta-feira, 5 de julho de 2012

Cinquenta anos...


Alexandre sempre se sentira atraído por mulheres mais velhas. E que fossem inteligentes. Apesar disso, casara com uma normalíssima colega de Faculdade que, em dez anos de união lhe dera uma filha.
Ambos inexperientes, perto do fim da década, deram-se conta que nada do que tinham, afinal, os satisfazia. 
Alexandre estava consciente da usura conjugal que nenhum soubera evitar e decidiu separar-se. Lígia ainda reagiu, estrebuchou, mas acabou por aceitar o divórcio.
E, embora muito ligado à filha de quatro anos, que ficara a viver com a mãe, Alexandre sentia-se aliviado, livre de algo que estava a tirar-lhe a alegria.
Mudou também de emprego e foi fazer aquilo de que gostava numa empresa que lhe estava a dar o seu real valor. E, se não fossem as saudades da garota arriscaria dizer que era feliz.
Um dia, no local de trabalho encontrou uma cara nova numa mulher que já o não era, se é que cinquenta anos, se pode definir como sendo uma idade madura... Vê-la e apaixonar-se não foi difícil.
Cristina era a madurez esplendorosa. Bonita, inteligente,culta, segura de si e divorciada. Enfim um terramoto de liberdade na vida daquele homem pouco experiente.
De repente, a única coisa que Alexandre desejava era ter aquela mulher toda para ele, sem sequer se perguntar se teria arcaboiço pessoal para aguentar o que essa exclusividade representaria.
Para Cristina ele era um jovem de trinta e sete anos que ela presumia ter pouquíssima experiência, mas que prometia rápida aprendizagem... Logo, não lhe causou qualquer apreensão dar "lastro" ao pretendente.
Este, de facto, precisava de rodagem, de alguém vivido que o ensinasse.
Depois de um ano de ligação mais ou menos clandestina, Alexandre queria casar e Cristina não viu nisso qualquer inconveniente, porque quando o prazo de validade seu, dele ou de ambos acabasse, ela partiria para outra,
Foram casados treze anos... Depois, ele queria conserva-la, mas ter acesso a carne mais jovem. Ela não quis. Separaram-se.
Anos mais tarde havia de voltar a procura-la, infeliz. Mas esperançado de que Cristina o aceitasse. Só que ela descobrira o prazer de ter um amor da sua idade...

Helena

terça-feira, 3 de julho de 2012

Filosofia de fim de semana


Às vezes Joana tem dúvidas. Do que foi a sua vida, do que de si entregou aos outros, do que os outros lhe entregaram a si. Olha para trás e, em certos dias tudo lhe parece certo. Noutros, menos segura, tem ideia de que a sua existência foi um puro erro de casting.
Em pequena era tímida. Em jovem afirmou-se. Em adulta foi sedutora. E agora, nem nova nem velha, não sabe quem é.
É a vida, dizem-lhe. Mas é a minha vida, responde. Sou eu que preciso de saber se é verdade quem penso que fui e que preciso de saber quem sou, na esperança de ainda poder perceber quem serei. Porque neste momento é só isso que importa a todos: saber quem se será.
Melhor ainda, saber se poderemos ser quem desejaríamos. Mas nem isso com precisão Joana sabe.
Lembra prazeres e alegrias, lágrimas e desgostos. Mas para que é que isso lhe serve, na definição de quem virá a ser? De nada. Nem pistas dá, porque, afinal, ela até já foi bastantes pessoas. 
E será que importa assim tanto saber quem poderemos ser? Importa sim, diz-lhe o seu lado moralista. Importa nada, diz-lhe o outro, o eu rebelde.
Joana só tem estas angústias ao fim de semana. Nos dias úteis não tem tempo. Sabe sempre quem é e quem será. Decididamente, o mais certo seria acabar com o sábado e o domingo...

Helena

domingo, 1 de julho de 2012

Vinte anos depois...


Ele insistia, por telefone, que precisava de a ver. Ela, de forma polida, ia-se esquivando, por entender que, ao fim de vinte anos de divórcio sem filhos, pouco ou nada haveria para dizer.
Elsa separara-se porque, em certa altura, se sentira a mais naquele casamento. Colocado perante a situação, Marcos não negou. Mas também não afirmou que pretendesse divorciar-se. Nada invulgar, convenhamos. Ele apenas gostava de duas mulheres. Realmente, embora de forma diversa. E se nenhuma delas levantasse a questão, ele não a levantaria.
Mas Elsa, que era inteligente, percebera. E, Amália que nunca desejara ser segunda, viu ali a chance para obter o que lhe faltava. Face à situação, o divórcio foi o caminho.
Elsa sofreu o seu maior desgosto e sentia-se culpada quando o colocava acima do que sentira quando perdera os pais. Havia, mais tarde, de obter a sua pequena vingança, quando ao fim de quatro anos daquela amargura, aceitara ser sua amante.
Hoje recorda esse período de um ano, como um dos melhores da sua vida. Acabaria por lhe pôr fim, quando percebeu que aquele homem  deixara de representar o papel de marido tão chorado. Coisas mesmo do destino.
Passaram vinte anos, que aqui ou ali, foram entrecortados por um telefonema de parabéns na data do aniversário de cada um. Nada mais.
Perante a insistência no encontro, Elsa não teve como rejeitar mais e acabou por aceitar o tal convite para jantar.
Mas vinte anos é muito tempo. Demasiado, num caso destes. Elsa não reconheceu Marcos à sua porta. Não queria acreditar que estava ali, alguém com quem vivera uma dúzia de anos.
O jantar tinha um fito. O tal abraço urgente trazia um nó na ponta. Mas Elsa não se importou, quando percebeu que afinal, aqueles vinte anos deixaram de ter qualquer valor no campo sentimental.
Ficou a amizade? Talvez. Mas ténue e sem qualquer hipótese de ser alimentada. Portanto, quase morta...

Helena 

Amizade colorida...


Ela não sabia bem o que se tinha passado entre eles. Mas hoje, à distância de uma meia dúzia de anos, pensa que terá sido o que, agora,  podemos classificar de colorida. 
Ele um jovem a entrar nos quarenta e a atravessar um período de insatisfação familiar - acontece a todos e quando não acontece, é melhor desconfiar -, ela na ressaca de uma relação mais ou menos poética, mas como quase todas as do género, um pouco irrealista. 
Um dia encontraram-se. Ela em Lisboa ele no Algarve, com uma distância de 200 Km entre eles. O flash pareceu-lhe mútuo e imediato.
A internet tem destes súbitos amores e assim, permitiram-se, um ao outro, fazer o "transfer" das respectivas tristezas, dando-se mutuamente uma amizade com laivos de algo mais, que não fora concretizado. 
A Lúcia tê-lo-á mitificado e o Pedro terá sentido nela o colo de que, no momento, até poderia precisar. E assim caminharam vários meses pontuados de encontros felizes, mas sem envolvimento físico. Sentiam-se bem assim.
Ela, sem se dar conta, foi expandindo o que sentia por Pedro. Este, ao contrário, foi-se reequilibrando e percebendo que na vida, familiar ou profissional, todos temos altos e baixos. Resumindo, ao que agora lhe parece, ela apaixonando-se e o Pedro libertando-se e tentando ficar o bom amigo.
Quando isto aconteceu houve, inevitavelmente, num dos lados, uma revolta . Sobretudo o dela, que sentiu nada haver ganho, em troca do muito que oferecera de solidariedade, de atenção, enfim de envolvência pessoal. 
As formas de reacção individual são múltiplas. Pedro continuou a sua vida e ela sentiu a dela esmorecer, sobretudo num período em que teve muitos outros eventos nefastos. 
Lúcia tinha vontade de se vingar. Mas nem sabia bem de quê. Se daquilo que havia recebido ou se daquilo que, afinal, não recebera. 
O tempo passou e a revolta, depois de aumentar, começou a diminuir. 
Um dia, Lúcia deu-se conta de que ultrapassara a crise. É que tinha começado a dedicar-se ao que verdadeiramente lhe devia ter sempre interessado na vida: ela própria. Até para, mais tarde, poder fazer, descomprometida, a sua própria análise. 
Hoje, sim, chegara a hora, de perceber que se não deve insistir em ser amigo de quem não quer ser nosso amigo, porque quer algo mais. 
Foi uma pausa longa. Só o tempo é bom conselheiro nestas matérias. 
E se a amizade, que no passado, pareceu uni-los, tiver pés para andar, ela acabará por voltar, quando já não possa ser mais do que isso!

Helena