quarta-feira, 30 de novembro de 2011

O castigo


A história passa-se nos anos sessenta. Natália e Vasco viviam com a mãe em casa dos avós, depois de um divórcio que, na época, não havia sido simples para ninguém. A garota tinha seis anos e o rapaz tinha doze.
A família materna, oriunda de uma média burguesia, encarou aquela situação de forma um pouco dramática, o que não admira muito, face aos valores da sociedade de então.
De facto, divórcios não eram correntes na altura e, por isso, a matriarca decidiu que o trio familiar deveria retornar à casa paterna e aí levar uma vida recatada para calar as más línguas.
Mas Rita, a jovem mãe, tinha trinta anos e não esperava, nem queria, ficar sozinha o resto da vida. Era uma mulher atraente que casara aos 17 anos com um homem com o dobro da sua idade e que se sentia com o direito a viver.
Por isso, quando, dois anos depois, conheceu Armando que, curiosamente, era uma década mais novo que ela, não se fez rogada aos seus avanços. Estes viriam a concretizar-se numa vida em comum - um escândalo - meses depois.
As crianças, essas, ficaram a viver com os avós. Mas o pai delas quis, alguns meses depois, ter o rapaz consigo, argumentando que considerava importante que um adolescente tivesse a seu lado uma figura parental, para poder ter um desenvolvimento psicológico saudável E o juiz deu-lhe razão.
Assim os irmão ficaram separados. Mas não foi por muito tempo. Com efeito, Rita, entretanto, casara com o companheiro e ambos foram para França, onde este último fora colocado.
Para prosseguir os estudos, Natália acabou por se juntar ao irmão e ir viver para a casa paterna.
Não eram infelizes. Pelo contrário, diria até que tiravam da situação o melhor partido. O pai e a mãe não se digladiavam e o padrasto, que tinha por eles grande estima, acabava por ser o elo forte na ligação de todos.
Os anos foram decorrendo. Rita vinha regularmente a Portugal ver os filhos. Armando preferia ficar em Paris, uma vez que a sua família original, muito pequena, já havia desaparecido.
Vasco acabou o curso e foi, por sua vez, para o estrangeiro. Natália entrou para a Faculdade.
Ia fazer dezanove anos quando recebeu um telegrama da mãe a dizer que o padrasto viria a Lisboa em serviço e lhe pedia que o fosse buscar ao aeroporto. Desencontraram-se, porque nenhum deles se reconheceu.
Chegada a casa dos avós, Natália teve uma forte emoção. O padrasto não lhe ficou atrás. Ambos se sentiram imediatamente atraídos um pelo outro.
Ele deixara-a uma miúda e encontrava uma mulher. Ela deixara de ver nele o marido da mãe e estava face a um homem de trinta e poucos anos extremamente atraente. Foi uma espécie de coup de foudre.
Os dias que se seguiram, de convivência diária, só acentuaram uma situação que ambos sabiam perversa, mas cujo controle lhes estava a fugir das mãos.
De um lado, o desejo mútuo de um homem por uma mulher e, de outro, uma relação familiar colateral que proibia qualquer forma de contacto físico entre ambos.
Um dia a corda ia ceder, o desejo ia tomar forma. Natália decidira encontrar-se com Armando no hotel onde este se encontrava hospedado. Salvou-os um AVC. Um AVC provocado, como terá dito o médico, pelo stress do paciente, por alguma tensão a que estivesse submetido.
Armando nunca mais voltou a ser o mesmo. E Natália ainda hoje considera que foi castigo divino...

Helena

4 comentários:

  1. que final!
    estou a rir que nem louco
    coitado de Armando :(

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  2. Desculpe a correção, mas pelas minhas contas a idade do Armando não é de quarenta e poucos anos mas sim 32. Senão vejamos: Rita divorciou-se com 30 anos (a filha tinha 6) e dali a 2 anos encontrou o Armando, mais novo 10 do que ela (ou seja, com 22).
    Entretanto, Natália (e não Rita) ia fazer 19 anos quando recebeu o telefonema da mãe e foi ao aeroporto. Ora, Natália tinha 8 anos quando a mãe conheceu Armando, com 22. E como ainda ia fazer os 19 anos quer dizer que tinha 18... e Armando 32.
    Às vezes são os pequenos pormenores que estragam tudo. Estive para deixar passar mas se fosso comigo preferia que me corrigissem, por isso desculpe o atrevimento e continue a escrever, que o faz bem.
    Bj

    P.S. Parabéns pelo novo livro.

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  3. Cara Felipa
    Muito obrigada. É o que dá ter a presunção de escrever directo dois texto ao mesmo tempo e confiar na revisão da minha preciosa Carla, a minha secretária, que como eu também falhou.
    Mas acabámos por nos rir as duas... e por lhe ficarmos muito agradecidas.
    Fez muito bem em não ter hesitado!

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