Antónia tinha nas mãos uma echarpe vermelha, mescla de lã e seda de grande qualidade.
Uma lágrima furtiva corria-lhe pelo rosto. O pensamento, esse, voltara vinte anos atrás quando, adolescente ainda, vivia fascinada pela mãe que tinha. Ou melhor, pela forma como ela se vestia e se apresentava. Para uma garota adolescente que era considerada o patinho feio da família, a figura materna era a referência absoluta.
Mas comecemos pelo princípio. Antónia tinha uma irmã um pouco mais nova e dois irmãos mais velhos. A mãe, divorciada, tinha 47 anos e já apaziguara os ódios da separação. Trabalhava e pretendia refazer a sua vida com alguém que lhe permitisse um upgrading social e financeiro.
A família acoitara-se no lar dos avós maternos que, não sendo ricos, tinham as reservas de uma vida contida pela experiência de quem atravessou a guerra.
Era este o ambiente em que a protagonista ia crescendo. Não era infeliz, mas vivia na ansiedade de se parecer com a progenitora.
Um dia, Ivone resolveu reunir os filhos para lhes participar que ia casar de novo. Nada que os surpreendesse. De facto, sempre esperaram que tal acontecesse.
No início continuariam em casa dos avôs e, mais tarde, quando o novo lar estivesse pronto, iriam para lá. O padrasto, advogado de posses e sem descendência, não se opunha. Até fazia gosto.
Mostrou-lhes, na altura, entusiasmada, a lindíssima echarpe que ele lhe havia oferecido e que ela colocara à volta do pescoço, a embelezar o tailleur que vestira para ir a um concerto.
Horas depois desta conversa, a trágica revelação. Ivone havia morrido asfixiada pela echarpe que se havia prendido numa das rodas do descapotável que dirigia e que pertencia ao futuro marido.
Antónia limpou a lágrima furtiva e voltou a guardar a echarpe assassina...
Helena
Sem comentários:
Enviar um comentário