quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Quem com ferros mata...

Clara estava desesperada. Acabara de confirmar que João tinha outra mulher na sua vida. Não sabia se era ou não uma coisa séria. Sabia apenas que estava a correr riscos de o perder e não sabia o que fazer perante esta nova realidade.
A raiva e a tristeza estavam a apoderar-se dela. É claro que, ao menos agora, deixara de ter dúvidas e passara a ter certezas. Mas eram certezas muito dolorosas. Vira-os a beijarem-se no carro. E em moldes demasiadamente esclarecedores.
Clara relembrou o que lhe dissera a sua mãe quando eles casaram. "Toma cautela filha. Ele é muito mais novo do que tu. Agora estás apaixonada e ele também. Mas daqui a uma década, os vossos doze anos de diferença contarão muito mais. Fala-te quem já viveu muito. Um dia vais perdê-lo para uma mulher mais nova e nessa altura a tua fragilidade será maior e a tua capacidade de reagires será menor. Para além de, como sabes, ser natural que ele queira ter mais filhos e tu já não estares em idade de correres esse risco. Pensa bem".
Ali estava ela, onze anos decorridos, e quase com cinquenta, casada com um homem que estava
no esplendor dos seus trinta e oito anos, enlevado por uma garota com a idade dos seus filhos.
Nem conseguia conduzir, tal a força das lágrimas que lhe corriam pelo rosto. Que falta lhe fazia, naquela altura, o pragmatismo materno.
Não conseguiu ir para casa. Foi ter com o seu irmão António, que era aquele com quem ela se abria sempre, desde a morte da mãe. Ele ouviu-a com toda a atenção e disse-lhe: “o que eu devo dizer-te é que te acalmes. E que penses que aquilo que o João agora está a fazer foi o que, afinal, tu também fizeste, quando decidiste ficar com ele. Ambos estão no mesmo patamar.
A diferença é que ele agora está casado contigo e nessa altura estava casado com a Teresa.
Só tens duas soluções. Ou esperas, como a Teresa esperou, apesar de o ter perdido para ti. Ou não és capaz disso, separas-te e entrega-lo de mão beijada a essa sua nova paixão.
Tudo o resto são fantasias. Só tu é que sabes a força que tens”.
De repente, Clara percebeu. Doía, mas sabia que o irmão tinha razão.
Voltou para casa e recebeu o marido com a melhor disposição sabendo que, quem com ferros mata, com eles pode morrer…

Helena

2 comentários:

  1. D. Helena,

    leia este comentário como sendo dedicado a todo o seu blog e não apenas a este texto. saiba é muito agradavel ler o que escreve, não sáo pela forma como pelo conteudo. Por vezes, e face à forma como olho a vida e comporto enquanto cidadão, perante alguns comportamentos e comentários de terceiros, chego a pôr a hipótese de ser um "cromo", um "careta", enfim... depois quando "convivo" com pessoas como a Senhora, chego à coclusão de que os meusPais me desenharam às direitas e até sou bom rapaz... Os valores morais e de cidadania que , de forma explicita ou implicita, estão presentes nos seus textos são um estimulo para continuar a ser como sou e a agir de acordo com a minha consciência... Afinal, como dizem os Xutos e Pontapés, "não sou o único". Muito obrigado pelos seus blogs.

    Respeitosos cumprimentos.

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  2. Caro Pedro Gaivota
    Muito obrigada pelas sua palavras que são um estímulo para quem pretende transmitir aos outros um pouco do que recebeu. Também eu estou grata aos meus queridos Pais por tudo aquilo que me deram tão gratuitamente!

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