sexta-feira, 18 de maio de 2012

A terra de ninguém


Era um magricela de quem todos se riam na escola. Tinha um olhar triste e adivinhava-se que em casa a fartura não devia ser muita.
João nascera numa família muito modesta onde nem pai nem mãe foram, alguma vez, alfabetizados. Talvez por isso, sempre olharam com grande desconfiança para aquela ambição de saber que o filho revelava. A bem dizer nem a compreendiam. E até consideravam que a sua obrigação era ajudar os pais na sua labuta diária e não ser o rato de biblioteca que na realidade era.
Um dia receberam uma carta da escola pedindo-lhes que autorizassem o João a participar de um concurso, cujo prémio era uma bolsa de estudos universitários em Inglaterra. Disseram de imediato que não, que não havia dinheiro para esse tipo de despesas.
Mas a bolsa pagava tudo, caso ele a ganhasse. E ganhou.
Foi um tempo essencial na vida do João que, durante cinco anos, não mais veio a Portugal. Excelente aluno teve, de imediato, uma oferta de emprego que aceitou sem reservas.
E, ao fim de um ano de trabalho, já com mais folga económica, veio ver os pais. A sua intenção era comprar-lhes uma casa melhor e proporcionar-lhes um fim de vida mais folgado.
Mas o encontro foi muito traumatizante. O jovem tornara-se um homem bem constituído e com uma bela presença. Mas o seu mundo já não era  o dos pais, nem estes conseguiam reconhecer naquele senhor o rapaz que os deixara com dezasseis anos. A conversa não fluía e o acanhamento dos três era flagrante
De retorno a Londres, João tinha a noção de que já não era dali, da terra onde nascera. Mas sabia, também, que tão pouco pertencia à terra, ao país onde vivia há cerca de sete anos. 
Há casos e momentos assim, em que sentimos que apenas pertencemos a uma terra de ninguém...

Helena

1 comentário:

  1. Antes de mais quero prestar-lhe aqui uma merecida homenagem de admiração e dizer-lhe que a considero uma mulher forte e um exemplo de integridade e convicção que deveria de ser reconhecido. E considero que mesmo que por vezes sintamos que "pertencemos a uma terra de ninguém" decerto que haverá algum lugar no Mundo que tenha um pedacinho de nós...*

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