
Mas tinha uma grande amiga brasileira, a Ariclê, que vivia desse tipo de actividade, depois de ter abandonado uma carreira de sucesso na área da gestão. O que ela fazia exactamente, Ivone não sabia, porque nunca quisera participar de nenhuma das suas sessões. Ariclê sempre insistira, mas sem êxito. O que ela lhe dissera é que era capaz de entrar no “arquivo morto” da nossa memória e retirar de lá lembranças que nos seriam de grande utilidade em dificuldades presentes ou futuras.
Ivone reconhecia que algum dom especial devia ter a amiga, que era visitada por gente vinda dos quatro cantos do país. E gente de nível intelectual acima de qualquer dúvida. Muitas vezes conversavam sobre as verdadeiras razões que levavam tantas pessoas a procurarem os seus serviços, mas ficavam por aí.
Uma noite Ariclê telefonou a Ivone para a convidar a jantar com um grande seu amigo e colega, o Professor Veríssimo, pessoa muito respeitada no Brasil e que vinha a Portugal fazer uma série de conferências.
- Tem que vir, minha amiga, porque você vai ficar surpreendida com a qualidade deste homem. Mesmo sendo céptica, como você é.
- Ariclê, você sabe o que eu penso dessas coisas. Depois não se admire se eu disser algo que lhe não agrade.
- Esteja descansada. Eu já disse ao Veríssimo o que você pensa. Nós vamos falar de outros assuntos. Ele acabou com um casamento longo e precisa de se distrair.
- Bom, então fica combinado. Passam a buscar-me?
- Sim senhora. Vai ver que vai gostar.
O jantar foi, de facto muito agradável. Falou-se de viagens, livros e cinema. O Professor era um excelente conversador. Já mesmo perto da casa de Ivone, enquanto a levava à porta de entrada do prédio, disse-lhe, à queima-roupa:
- Ivone, você vai voltar a casar-se dentro de dois anos.
- Terei que me divorciar primeiro, meu caro amigo. Porque tenho um marido e espero mantê-lo por muito mais tempo do que isso…
- Só lhe digo isto. Um dia falaremos!
Já em casa, Ivone contou ao marido o que se passara. Ele apenas sorriu.
Ariclê retornou à sua terra e nunca mais falaram no assunto. Um dia recebeu um telefonema de Ivone a dizer-lhe que ficara viúva. O marido falecera num acidente de automóvel. E ela resolvera passar uns dias no Brasil.
- Venha sim, amiga. E sem data certa para voltar. Para poder descansar.
Quando chegou, Ariclê havia preparado um jantar para a apresentar aos amigos. Que, aliás, a receberam de braços abertos. Em particular Veríssimo que, a brincar, lhe relembrou a previsão que fizera. "Ainda faltam seis meses para terminarem os dois anos", disse ele a sorrir.
Mas a previsão cumpriu-se. Casaram um com o outro... quando terminou o semestre que faltava à profecia!
Helena